o grande nada

Pensamentos, confissões, teorias, dia-a-dia. Palavras palavras palavras. E o que mais...? Só. No fundo é só isso e mais nada. O que significa?

Sunday, February 15, 2004

Crítica filosófica a partir de um bom-bril numa antena de televisão:

Estava eu lá, levemente alterada, devo assumir, mas lúcida. Entrei na cozinha e tive uma visão, um insight do mundo. Captei a beleza escondida e ao mesmo tempo tão óbvia da vida cotidiana, de uma cozinha normal. Fiquei extasiada com a simplicidade dos azulejos, do relógio com os pássaros no lugar das horas, das frutas de cera, da televisão de '91 com bom-bril na antena, do quadro de natureza morta e do pacote de bolacha que deveria estar no lixo, mas reinava sobre um prato sujo na pia. Foi um momento sublime.

Daí me empolguei! Percebi que aquela era a beleza real, a da simplicidade da vida cotidiana de classe média. Aquela cozinha, e não a pré-fabricada, irreal, toda branca, irritantemente limpa e metida a americana, era a verdade. As cozinhas americanas, junto com os joguinhos americanos, não. O bom mesmo é o copinho americano, aquele de boteco, pra servir uma dose pra começar o dia. E o problema estava na mídia, na minha cabeça, na segunda meia-noite de um dia muito animado. A mídia, gesticulava eu, era quem controlava o que é "socialmente aceito" ou "belo": ela estabelecia os padrões, as tendências, as normas. Mas ao mesmo tempo ela era a porta-voz da sociedade. Uma relação de troca, de patrão e empregado ao mesmo tempo.

A minha platéia, constituída por um cabeludo e barbudo comendo farofa num prato duralex, outro cabeludo e dono da casa (de quem eu senti uma pontinha de orgulho pelos constantes elogios à sua cozinha), outro cabeludo que aparenta ter 14 anos e na verdade tem 18, e outro com cara de 12 que tem 17, mostrou-se bem receptiva às minhas idéias. Certo, alguns riram, mas no geral me apoiaram enfaticamente, provavelmente envolvidos pela paixão que embalou meus argumentos.

Une bonne soirrée.

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